Thursday, July 9, 2009

DANDO VALOR AOS AMIGOS Obama e a Nova Estrategia para a America Latina

Ironildes Bueno*

Ha algo verdadeiramente novo em Washington. Esse algo novo é a maneira como a capital norte-americana passa a tratar o Brasil. Pela primeira vez nos ultimos anos, no que diz respeito a America Latina, a imprensa e os formadores de opiniao publica em Washington, seguindo os passos do lider Barack Obama, comecam a dar mais atencao a um amigo do que aos inimigos. É bastante interessante notar a maneira como o Brasil finalmente vai superando a Venezuela nas colunas dos jornais e nos corredores das universidades da capital norte-americana.

É verdade e deve ser dito claramente que um dos grandes meritos de George W. Bush foi o percepcao de que nao deveria conflitar com o entao historico esquerdista Lula da Silva, quando esse chegou ao poder, em 2003. No entanto, essa postura de Bush em relacao a Lula nao impediu que o lider norte-americano desse mais atencao ao rival declarado, o polemico presidente venezuelano Hugo Chavez. Desse modo, ao ocupar-se mais do inimigo, Bush, a imprensa, e os academicos de Washington reservavam boa parte dos discursos politicos, das noticias nos jornais e dos eventos academicos para a Venezuela e outros países considerados do “bloco” de Chavez. Até mesmo países com baixíssima parcela relativa de poder, como a Bolívia e o Equador, passaram a ter mais peso que o Brasil no debate de politica internacional conduzido em Washington. No entanto, com Obama isso definitivamente está mudando.

A nova situacao leva a crer que um dos conselheiros de Obama para a America Latina, ou talvez o proprio presidente por si mesmo, tenha percebido que os interesses dos Estados Unidos da America sao melhor atendidos quando o governo norte-americano dá mais valor e espaco, inclusive no discurso politico, aos amigos que aos adversarios. Por um lado, percebeu-se que provocar ou dar atencao as provocacoes do presidente Chavez acaba por fortalece-lo. A melhor maneira de cala-lo é nao falar dele. Por outro lado, é crescente a idéia de que, sobretudo diante da crise economica global, é preciso ajustar o debate politico ao peso economico dos países da regiao e, portanto, dar especial voz e vez a paises como o Brasil e o Mexico.

Outra coisa nova em Washington é a conscientizacao de que os intrumentos de analise da situacao latino-americana precisam ser reavaliados. É crescente a suspeita de que a abordagem como feita até recentemente estava influenciada por resíduos de nocoes do tempo da Guerra Fria, como se houvesse um “bloco” liderado por um “polo” representado pela Venezuela. Ha gente muito seria e influente em Washington que comeca a acreditar que nao nao existe uma situacao de “alinhamento” entre a Venezuela e seus vizinhos. Essas mesmas pessoas acreditam que se tem superestimado o peso de Chaves na ascensao e no conteudo das polticas de lideres como Rafael Correa, Daniel Ortega e Evo Morales. O novo pensamento é de que, ainda que nao se possa negar a influencia do presidente venezuelano nas politicas de alguns paises da regiao, existem fatores proprios da Bolivia, do Equador e da Nicaragua que sao muito mais importantes que Chavez e definitivamente muito mais determinantes para a definicao do quadro politico vigente nesses países. Em outras palavras, ainda que Correa, Morales e Ortega se parecem a Chavez, aqueles nao sao “crias” desse. A elasticidade do populismo – capaz de transitar da extrema direita a extrema esquerda, sem prejuizo a sua essencia − é indicada como sendo um desses fatores que, independentemente de Chavez, empurram os governos e as sociedades desses países rumo as atuais praticas.

Finalmente, o sentimento que comeca a se consolidar em Washington é o de que uma maneira mais intelegente e mais eficiente de enfraquecer os inimigos é fortalecendo os amigos. Quando o presidente Barack Obama reconhece o Brasil como “jogador global” e rasga elogios ao seu colega brasileiro, ele está dando “estímulo” a um regime que, ainda que longe de ser o ideal, faz do Brasil algo bem mais proximo dos valores defendidos pelos EUA do que a barulhenta Venezuela de Chavez.

Ironildes Bueno é Pesquisador Visitante da Georgetown University, em Washington.

DIREITA, VOLVER! Mitos sobre a Direita no Brasil

Ironildes Bueno*

Não existem partidos ou líderes políticos de direita no Brasil— pelo menos se levarmos em conta o critério de auto-identificação. Esse procedimento é largamente utilizado, até mesmo pelo polêmico sistema de cotas instituido no ensino superior nacional, pelo qual negro é quem se auto-identifica como tal. Aplicando o mesmo critério para classificar partidos e líderes políticos, pode-se afirmar que de um modo geral não há direita no Brasil. Os líderes políticos não declaram em alta e clara voz “eu sou de direita”! O sujeito, no máximo, é de centro — e preferencialmente de centro-esquerda. Se existe uma direita, ela só existe por exclusão: aqueles que não se identificam como pertencentes à esquerda ou ao centro são “banidos” para a direita. Honestamente, no Brasil ser de direita é impopular. Dizer que alguém é de direita é quase uma acusação, senão um xingamento. A questão é: por que isso acontece? Certamente, a razão disso é o fato de existir no país um grande número de preconceitos e mitos em relação ao que é ser de direita.

O primeiro mito é aquele que relaciona a direita à ditadura. Que a história está cheia de ditaduras de direita não há dúvidas. No entanto, também não há nenhuma dúvida que o número de regimes autoritários de esquerda é ainda infinitamente maior. Por alguma razão, intelectualmente ingênua ou desonesta, muitos formadores de opinião se esquecem rapidamente que eram de esquerda os autoritários e brutais regimes de Maximile Robspierre na França, de Lenin e Stalin na então União Soviética, de Mao Tse-Tung na China, de Ho Chi Mihn no Vietnã, de Daniel Ortega na Nicarágua, de Agostinho Neto em Angola, etc e etc. Isso para não mencionar que o maior símbolo da esquerda latino-americana (o argentino “Che” Guevara) foi um dos fundadores e ideólogos do único regime não-democrático atualmente existente nas Américas. Aliás, é preciso denunciar que a maioria dos professores de História do ensino médio enganam nossos adolescentes, vendendo Che Guevara como um herói da resistencia democrática. É uma pena que a profissão de historiador ainda não seja regulada no país, pois se fosse, alguém teria que ser condenado por desonestidade intelectual, doutrinamento ou algo correspondente! Está mais do que claro que historicamente ditadura não é característica exclusiva ou automática da direita, do centro ou da esquerda.

O segundo mito é o de que ser de direita é ser inimigo do bem-estar social. O que os construtores dessa idéia ignoram, ou pretensamente ignoram, é que durante a Guerra Fria, foram as potências capitalistas situadas à direita do esquerdista bloco comunista que alcançaram os mais altos padrões de vida e de conquistas sociais. É simples: os habitantes de Berlim Ocidental (capitalista) tinham um melhor padrão de vida do que os de Berlim Oriental (socialista) e, por isso, o muro foi derrubado pelos ultimos e não pelos primeiros! Ora, obviamente a questão não é ser a favor ou contra um maior número de pessoas partilhando de boas condições de vida. O que difere a esquerda da direita é o caminho a ser trilhado. Há que ser dito que a direita não só defende uma sociedade em que se possa viver com dignidade, como fortemente acredita que tem a melhor proposta para atingir o legítimo e sustentável bem-estar social.

Existem ainda outros mitos. Alguns deles divorciam a direita dos Direitos Humanos ou impõem um casamento necessário entre direita e corrupção, outros criam um maniqueismo pobre através de uma falsa dualidade esquerda-nacionalista e direita-entreguista. Esses mitos incorrem em muitos equívocos, como o de confundir interesse público com interesse de funcionários públicos ou interesses de outras corporações tão fortes como, em geral, improdutivas.

Roberto Campos – um dos melhores representantes do pensamento de direita no Brasil e, ao mesmo tempo, uma das maiores vítimas dos preconceitos contra o mesmo pensamento –sempre chamou a atenção para os mitos e inverdades disseminados pelos intelectuais de esquerda a respeito da história político-ideológica do Brasil. Na ausência de Campos, uma vez mais é preciso reconstruir o orgulho de ser de direita e de se identificar como tal, plenamente convictos de que isso significa ser democrata, defensor do bem-estar coletivo, dos Direitos Humanos, do meio-ambiente, das minorias e, sobretudo, da liberdade.

Ironildes Bueno é Pesquisador do Centro de Estudos Latino-Americanos da Georgetown University, em Washington.

NOSSOS PRÓPRIOS MALES

Ironildes Bueno*

As relações internacionais têm muitos aspectos comuns com as relações interpessoais. No caso das últimas, alguém já disse que as pessoas poderiam ser classificadas em dois tipos, dependendo do modo que reagem a uma situação de fracasso. O primeiro tipo é o daquelas pessoas que questionam: “quem fez isso comigo?”; já o segundo tipo é o daqueles que se perguntam: “onde foi que eu errei?”. Parece que, nas relações internacionais, a situação não é muito diferente. O filósofo alemão Friedrich Nietzsche já havia percebido isso no século XIX e deixava a entender que existem nações que são “responsáveis” e nações que são “ressentidas”. Diante do exposto, resta inquerir: que tipo de nação somos nós, brasileiros? Uma nação de responsáveis ou de ressentidos?

Merece uma especial atenção um conjunto de exemplos retirados da História Moderna e Contemporânea de nações que, ao invés de lamentar o passado, assumiram a responsabilidade pelo seu futuro e pela reinvenção de si mesmas. Vale citar alguns casos. Primeiro, a história dos Estados Unidos, a primeira nação a surgir como tal no continente americano. Em vez de culparem os ingleses pela a exploração colonial e a instituição da escravidão, a nova nação removeu os obstaculos internos para o seu progresso, mesmo que as vezes a custo de sangue e de guerra civil. O resultado disso foi que a jovem nação exportou seus valores e suas instituições para o novo e o velho mundo e garantiu para si a incontestável condição de nação mais importante do planeta. A alemanha e o Japão são outros dois casos muito interessantes. Os alemães não eram muito simpáticos aos ingleses, no entanto, em vez de guiarem-se por qualquer resentimento em relação aos últimos pelo atraso industrial da Alemanha em frente a Inglaterra de meados do século XIX, os germanos trataram de se unificar e de, ainda que tardiamente, construir a nação que terminou aquele século como o principal ator da cena internacional européia. O Japão é um caso por excelência. Os japoneses poderiam muito bem se escorarem na sombra radioativa de Hiroxima e Nagasake e culparem os Estados Unidos pela situação lastimavel em que se encontravam no imdeiato pós-Guerra. Longe disso, os japoneses se alinharam ao seu antigo rival e usaram essa alianca como trampolím para devolver ao Japão um lugar de glória em meio a comunidade dos povos.

Contudo, a História Moderna e Contemporânea também é cheia de casos de ressentimento e de gente ressentida. Sinceramente o caso das nações africanas e latino-americanas são os primeiros a serem mentalizados. Basta conversar sobre política internacional com um argentino médio que em poucos segundos você vai ouvir uma ladainha sobre como os Estados Unidos — e não os casais Juan/Eva Perón e Nestor/Cristina Kirchner e a própria sociedade argentina — são os responsáveis pelos males que afetam a “européia” e fracasada nação platina. Igualmente, poucos mexicanos não concordariam com a nacionalmente famosa expressão “pobre México, tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos”. Sobre o que se ouviria em Cuba, Venezuela, Bolívia, Nicarágua e Equador creio ser dispensável tecer qualquer comentário.

Finalmente, cabe voltar a questão inicial: e o Brasil, que tipo de nação somos? Uma nação de responsáveis ou de ressentidos? Me parece que a resposta e híbrida. Somos isso e aquilo. Por um lado, existem setores da intelectualidade, dos partidos políticos e de organizacões da sociedade civil brasileira que seguem uma disposição mental para acreditar que o culpado pelos fracassos nacionais é sempre o outro, seja esse outro um país estrangeiro ou um outro grupo social que não aquele ao qual esses indivíduos pertencem. Por outro lado, é cada vez mais crescente o número de pessoas no Brasil que estão plenamente convencidas de que a pergunta mais apropriada nao é quem fez isso comigo? Este grupo já aprendeu a perguntar-se onde foi que erramos? Não surpreendentemente, é exatamente esse último segmento da sociedade brasileira que está por trás dos grandes avanços e das grandes empresas brasileiras que — seja nas ciências, na tecnologia, no setor de saúde ou nos esportes —engradecem a nação brasileira no exterior.

A conclusão de tudo isso é simples e dura: o ressentimento é inegavelmente uma das forcas mais perversas da história das nações. Pior ainda é o fato dessa perversidade ser acompanhada pela incompetência típica dos irresponsáveis. Portanto, façamos coro a outro filósofo (Jean-Paul Sartre) e brademos em alta voz: não importa o que (Portugal, Inglaterra, EUA ou a Argentina) fizeram de nós, mas o que faremos com aquilo que fizeram de nós. Nós – e ninguém mais - somos os maiores responsáveis pelos nossos próprios males.

*Ironildes Bueno é Pesquisador do Centro de Estudos Latino-Americanos da Georgetown University, em Washington.

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